sexta-feira, 12 de setembro de 2008

O menino na pia





O menino na pia me diz muita coisa. Seus olhos me fascinam, seu sorriso me convida, seus gestos me educam. A cena me hipnotiza e comove. Emoções se desdobram, memórias se revolvem e sonhos desabrocham ao contemplar o menino na pia.

O menino na pia é a encarnação da alegria e simplicidade. Ele me recorda que, para ser feliz, basta não pensar no muito que me falta, mas focar naquilo que sou e disponho.

O menino na pia é a personificação do relaxamento e bem-estar. Vive o momento presente como um presente a ser usufruído plenamente. Da pia, ele observa o mundo e conclui que o melhor é aproveitar cada instante. Agora, por exemplo, é a hora do banho e da curtição. A isto ele se entrega, sem reservas.

O menino na pia é a expressão da liberdade, da leveza do ser. A água jorrando da torneira é uma grandiosa cachoeira, ele é um corajoso aventureiro, e os frascos de desodorante, seus distintos companheiros, com os quais, generosamente, divide seu fabuloso mundo. Com uma mente tão leve, a imaginação é abundante e o coração vive em paz.

O menino na pia é a corporificação da fluidez, da confiança. Recebe e dá olhares amorosos, toques carinhosos, risos prazerosos. Recebe e dá afeto, alegria, aceitação. Não há tensão, retenção, pretensão ou ostentação. Apenas a intenção de viver e amar. Tal como precisamos aprender a ser.

O menino na pia é a sensação gostosa de ser criança. E ser criança é coisa séria, dá muito trabalho. Afinal, não se deixar contaminar pelas preocupações e limitações dos adultos exige esforço e vigilância permanentes! Com sua cara satisfeita e sorriso maroto, o menino na pia não quer saber de “risco Brasil”, “escândalo da CPI”, “guerra ao terrorismo”. Ele deixa essas coisas para aqueles que já não cabem numa pia, já não sabem usufruir um banho, já não conseguem brincar com a imaginação que transforma o frasco de xampu ora em pato, navio, avião, peixe... O menino na pia sabe, consegue e vivencia tudo isso. E nem por isso se sente superior aos demais.

O menino na pia é o contraponto ao executivo em sua onipotente poltrona empresarial e ao rei, em seu reluzente trono imperial.

O menino na pia é o lembrete que eu, também, poderia ter estado lá, naquele estado de plena satisfação. Agora já não me é suficiente a pia, teria que ser uma banheira. Com hidromassagem! Ele, caso deseje, poderá um dia estar em meu lugar. Eu, no entanto, já não tenho mais a opção de estar no lugar dele. Para ele, tudo é futuro. Para mim, muita coisa ficou no passado e algumas, ocultam-se adiante nos labirintos do tempo vindouro.

O menino na pia, para meu orgulho e honra, é meu sobrinho!

PS: Escrito em 25.11.2004, em homenagem a Daniel Badi, meu amado sobrinho.

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